Editorial
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Abstract
Apresentamos a nova edição da RAC, com seis artigos que abordam uma diversidade de temas e métodos de pesquisa na área de administração. Dado o caráter crÃtico de um dos artigos a respeito de caracterÃsticas de estudos de caso publicados, aproveitamos a oportunidade para brevemente discutir alguns aspectos relacionados a esse método de pesquisa. Inicialmente, descrevemos os artigos dessa edição.
No primeiro, Valor da Tecnologia da Informação na Firma: Estudo com Empresas Brasileiras, Deyvison de Lima Oliveira, Antonio Carlos Gastaud Maçada e Gessy Dhein Oliveira analisam "se o valor da TI continua a ser captado pelas medidas de desempenho da firma". A partir de "dados objetivos e variáveis de 149 empresas lÃderes em TI no Brasil ... confirmou-se o impacto nulo das capacidades de TI diretamente no nÃvel da firma - corroborando as demandas da literatura para análise desse impacto em nÃveis intermediários de desempenho".
No segundo artigo, Avaliação do Risco Regulatório em Pesquisa & Desenvolvimento no Setor Elétrico Brasileiro, de José Luiz Pereira Brittes, Sergio L. M. Salles-Filho e Mariana Savedra Pfitzner, estuda-se uma "metodologia de avaliaçãoex-ante de projetos de P&D&I do setor elétrico, incorporada a uma ferramenta de análise multicritério, com foco em risco". Método aplicado em situações especÃficas, permitiu que tomadores de decisão analisassem "a pertinência de investimento em 16 projetos, totalizando R$ 61 milhões em 2010, com riscos de glosa minimizados".
Já o terceiro artigo, Governança e Estratégia de Cursos de Graduação em Administração na Perspectiva da Teoria Ator-Rede, de Ludmilla Meyer Montenegro e Sergio Bulgacov, investiga "como a articulação dostrategizing, como o processo de translação, com a teoria das redes de governança, configuram a governança e os resultados estratégicos de cursos de graduação". Analisando-se os dados por meio de "(a) Análise de Narrativas; e (b) Análise Qualitativa Comparativa (Qualitative Comparative Analysis [QCA])", identificou-se "que o processo de strategizing e o entrelaçamento de atores humanos e não humanos são essenciais para a compreensão da governança e dos resultados estratégicos das instituições estudadas".
No quarto artigo, Responsabilidade Social Corporativa e Desempenho Financeiro das Empresas Brasileiras na Crise de 2008, Lilian Marques Freguete, Valcemiro Nossa e Bruno Funchal analisam "a relação entre a prática de Responsabilidade Social Corporativa e o Desempenho Financeiro de empresas brasileiras durante um perÃodo da crise financeira de 2008". Por meio de uma modelagem "de diferenças-em-diferenças com dados em painel ... verificou-se que, durante crises, firmas responsáveis socialmente não têm um diferencial de desempenho financeiro em relação à s outras firmas no mercado, apesar de ter-se encontrado um efeito significativo que a crise traz para as empresas em geral".
O quinto artigo, Estrutura de Capital e Remuneração dos Funcionários: Evidência EmpÃrica no Brasil, Duk Young Choi, Richard Saito e Vinicius Augusto Brunassi Silva, estuda se "uma empresa com maior alavancagem financeira implica que seus funcionários demandem maiores salários, dado o risco de financialdistress". Os resultados sugerem que, "para cada 1% de alavancagem financeira incremental, a remuneração dos funcionários aumenta em 0,26%, mesmo controlando para o perfil do Chief Executive Officer(CEO)".
O sexto artigo, Case Study in Public Administration: A Critical Review of Brazilian Scientific Production, de Mariana Guerra, Adalmir de Oliveira Gomes e Antônio Isidro da Silva Filho, "apresenta uma revisão crÃtica de parte da produção acadêmica brasileira em administração pública", focando a análise em trabalhos baseados em estudos de caso. Os resultados da análise dos estudos de caso "indicam falhas e inconsistências metodológicas" como, por exemplo, "descrição confusa da metodologia; descrição de resultados inconsistentes com a coleta e a análise de dados; falta de informação a respeito dos entrevistados; e falta de descrição das variáveis investigadas".
Assim, esse artigo analisa criticamente estudos de caso na área de administração pública, indicando diversos pontos de atenção. Aproveitando o gancho do tema desse último artigo e extrapolando a discussão para a área de administração como um todo, pode-se especular que trabalhos submetidos a periódicos e que eventualmente não passam no processo de avaliação podem ainda estar sujeitos a crÃticas mais contundentes.
A despeito de os casos terem grande importância para a prática e para a teoria nesta área, muitos desses estudos sofrem de deficiências que os tornam menos adequados à publicação em periódicos cientÃficos por comumente trabalharem situações sem que uma fundamentação sobre a efetiva contribuição seja apresentada. Situações simplistas que aplicam uma técnica ou um método em um caso escolhido por conveniência e não necessariamente pela importância para a investigação de um determinado fenômeno podem ter menor apelo. Deve-se evidenciar que esses problemas metodológicos não são especÃficos aos estudos de caso. Todavia, ficam menos evidentes quando a pesquisa aborda um número maior de casos ou quando leva em consideração análises de um número maior de observações mesmo quando são obtidas em uma amostra não probabilÃstica.
Perry (1998), fazendo uma avaliação para a área de marketing, indica que estudos de caso são conhecidos por educadores e estudantes como mecanismos de ensino por meio dos quais há uma ambientação persuasiva, um envolvimento emocional e uma orientação para o aprendizado implicando a ação e a tomada de decisão em situações complexas e reais, com informação incompleta, objetivos conflitantes, etc. (Andersen & Schiano, 2014; Ellet, 2007). Perry (1998) também estabelece que os estudos de caso podem ser usados como método de pesquisa (Gerring, 2007; Woodside, 2010; Yin, 2011, 2013). Porém, conforme Yin (2003), vários livros-texto sobre métodos de pesquisa em ciências sociais fazem pouca menção a esta modalidade de estudo.
É importante destacar que a decisão pela relevância de um caso pode depender de um convencimento do parecerista de que este, mesmo que tratando de uma situação ou organização mais modesta, gera interesse ao público-leitor, trazendoinsights relevantes. Um balanceamento entre especificidade de um caso e contribuição para a teoria deve ser buscado.
Para evitar uma discussão menos subjetiva, tendo em vista que opiniões sobre especificidade e contribuições podem ser controversas dependendo de visões particulares (Weick, 2007), um trabalho relevante que discute de maneira mais estruturada e objetiva o uso de estudos de caso na área de administração é o de Siggelkow (2007), no qual o autor apresenta sua experiência em leitura, revisão e elaboração de artigos baseados nesse método.
Em seu trabalho, Siggelkow (2007) busca responder a pergunta sobre o que faz um estudo de caso ser persuasivo, usando uma regra geral na qual quanto mais importante ou grandiosa a afirmação, mais independente de outros elementos ela deve ser. Siggelkow (2007) sugere, portanto, que um leitor deve ser convencido da lógica interna do argumento simplesmente lendo a parte conceitual do artigo, sem que o processo de convencimento dependa do caso em si.
A despeito de o argumento anterior parecer contraditório por talvez retirar, do estudo de caso, o foco sobre o próprio caso, Siggelkow (2007) justifica a relevância do método para os objetivos de: (a) motivação do problema de pesquisa, confrontando um modelo baseado em motivação puramente teórica com um mecanismo de motivação fundamentado em uma situação do mundo-real, que tem um maior apelo; (b) inspiração de novas ideias, principalmente no caso em que o conhecimento teórico é limitado e em que uma estratégia de pesquisa indutiva pode ser relevante para que a teoria seja uma implicação dos dados; e (c) ilustração, que permite ao leitor um entendimento do argumento conceitual a partir de um exemplo concreto.
Assim, estudos de caso podem ter importante papel na construção de conhecimentos e na formulação de teorias. Por exemplo, Welch, Piekkari, Plakoyiannaki e Paavilainen-Mäntymäki (2011) apresentam, com foco na área de negócios internacionais, uma classificação de estudos de caso de acordo com o método de teorização, considerando, dentre outras, as seguintes perguntas: como os autores relacionam teoria com dados empÃricos, se os autores integram o contexto da pesquisa na explicação teórica do caso, quais as fontes metodológicas, se os autores fazem generalizações a partir de dados do caso, etc...
Ainda sob o aspecto de construção de teoria, Eisenhardt (1989) apresenta uma rica discussão, buscando alinhar conceitos associados a dados qualitativos, lógica indutiva e pesquisa, usando estudo de caso, analisando o processo de indução de teoria a partir de especificação das perguntas de pesquisa, definição do problema, validação de constructos e utilização de lógica de replicação.
Dentro do contexto da área de estratégia, Gibbert, Ruirok e Wicki (2008) estabelecem que estudos de caso como ferramentas para geração e teste de teoria podem proporcionar insights extremamente valiosos. Porém, rigor é imprescindÃvel para que a relevância da pesquisa em administração possa ser justificada (Gibbert & Ruigrok, 2010;Scandura & Williams, 2000).
Assim, considerando questões de rigor metodológico, contemplando potenciais obstáculos para publicação comumente levantados por pareceristas que avaliam estudos de caso, Siggelkow (2007) indica alguns pontos: (a) amostra muito pequena; (b) falta de representatividade; (c) necessidade de coleta de mais dados, estudando mais casos; e (d) problema de endogeneidade. Em particular, a endogeneidade é uma questão relevante, na verdade, extremamente importante, e será tratada em uma outra oportunidade.
Por hora, desejamos a todos uma ótima leitura dos trabalhos dessa edição da RAC.
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